sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Filosofia da Ciência e Teoria do Conhecimento: nossas disciplinas para o último bimestre do ano.

No dia 1º de Outubro de 2012 iniciamos o quarto e último bimestre escolar de 2012. E iniciamos programando atividades especiais. Nosso foco neste bimestre está no âmbito da Filosifa da Ciência e da Teoria do Conhecimento. Temas, sem dúvida, fascinantes. Iremos usar agora um metodologia mais ativa, com a participação mais direta dos alunos em todas as aulas. Para isto estamos programando para cada turma algo em torno de seis a sete seminários no bimestre. Os primeiros ocorrerão com as turmas do 3º e Segundo Ano Seriado, no dia 5 de outubro. Para introduzir o panorama destes seminários reproduzimos abaixo um texto que indaga os limites do conhecimento:


AS MÚLTIPLAS FACES DA VERDADE

De minha adolescência uma imagem marcante, que ficou como resíduo de memória, foram trechos de um filme que apresentava o julgamento de Jesus por Pôncio Pilatos, segundo a tradição dos evangelistas, no Novo Testamento da Biblia cristã:

A cena apresentava a figura do Nazareno, com as mãos, atadas e em certo momento Pilatos indaga: - O que é a verdade? A sequência do texto é expressa pelo evangelista João conforme reproduzimos abaixo:

“Perguntou-lhe, pois, Pilatos: Logo tu és rei? Respondeu Jesus: Tu dizes que eu sou rei. Eu para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz. João 18:37”
“Perguntou-lhe Pilatos: Que é a verdade? E dito isto, de novo saiu a ter com os judeus, e disse-lhes: Não acho nele crime algum João 18:38”

O silêncio de Jesus face à pergunta me pertubava. Como podia o filho de Deus calar-se pertante uma das indagações mais contundentes para todos os humanos? O incômodo deste silêncio tinha uma marca profundamente existencial e produzia uma ressonância em uma estrofe do poema “Alguma Poesia”, de Carlos Drummond de Andrade:

“(...) Meu Deus, porque me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.(...)”

Com o peso desta dúvida, tomada como pessoal, inicio minha trajetória em busca de alguma resposta. Afinal o que é a verdade? Porque em nome de uma verdade formamos exércitos, matamos e morremos? A minha verdade é uma mentira para meu inimigo, que defende a sua verdade, mentira para mim, em nome de Deus.

Em busca de uma sistematização

No início da década de 1970 muitos dos que adotaram uma ação de resistência ao regime militar tinha seus referenciais para a ação em uma leitura teológica da luta de emancipação do proletariado. Era natural, portanto, que os chamados movimentos de Ação Católica fossem buscar na noção de dialética, verdade histórica e ideologia, inspiradas no pensamento marxista, uma síntese com o pensamento cristão. Um importante teólogo que inspirou esta busca foi Theilhard Chadin. Havia uma necessidade premente de construirmos um sentido de verdade fundado nas pesquisas científicas, mas comprometido com a mensagem cristã. Nesta busca vale recordar alguns limites que poderiam ser apontados na nossa busca da verdade, senão vejamos.
Tendo como referência os textos da professora Marilene Chauí – Convite à Filosofia – observamos que toda a história da filosofia é marcada por dois pontos centrais:
a)     (...) “ A verdade do mundo e dos humanos (...) podia ser conhecida por todos, através da Razão, que é a mesma em todos.(...) Assim a Filosofia nasce como conhecimento racional da ordem do mundo ou da Natureza (donde o nome cosmologia )(...)”
b)     Se a realidade é um fato objetivo – exterior aos seres humanos – o maior desafio do saber filosófico é desenvolver uma metodologia, que através da razão, do pensamento, revele objetivamente esta verdade.

Numa fase posterior encontramos uma singular elaboração, desenvolvida pelo filósofo Sócrates, que identificará na introspecção  o caminho do conhecimento. A expressão “conhece-te a ti mesmo”, tornou-se a divisa deste filósofo. “Por fazer do autoconhecimento ou do conhecimento que os homens têm de si mesmos a condição de todos os outros conhecimentos verdadeiros, é que o período socrático é antropológico”
De fato, este é um dos poucos momentos da filosofia que o, a saber, o conhecimento, é construído permeado pela psyché (e que arriscaríamos a considerar como os primórdios da investigação psicológica).

Todavia não encontramos aí nenhuma referência à noção de subjetividade. E, os períodos seguintes da história da filosofia, o conhecimento racional, de uma realidade que pode se revelar em sua objetividade constituirá o traço principal de todos os métodos. Em alguns momentos esta realidade se mostra como revelação (Deus mostra aos homens verdades que são dogmas, segundo seus porta-vozes terrenos).

Apenas no período contemporâneo (final do século XIX e toda a primeira metade do século XX) importantes descobertas, obrigam-nos a uma nova reflexão e, certamente, a uma postura intelectual mais tolerante.
O saber científico ao se identificar como A Ciência constrói verdadeiras muralhas em relação aos outros saberes – afinal ele é fruto de um método racional, de uma história que afirma este método e da própria objetividade que o credencia como saber legítimo. Mas neste caso faria sentido indagarmos sobre um possível diálogo entre Filosofia e Psicologia? De qual filosofia? De qual psicologia? 

Provavelmente, por isto mesmo, o cientificismo (e seus ramos dentro da psicologia, como a utilização instrumentalizada do próprio Behaviorismo) ganha feições de dogma. O domínio e as descobertas científicas afastaram a filosofia de sua principal tarefa, que é o contínuo se indagar e se questionar.

Através das contribuições do crítico social e filósofo Carl Marx, depurou-se a noção de ideologia, como um grande filtro, a permear nossos olhares, reflexões e construção do saber. Se a ideologia permeia nosso próprio modo de fazer ciência não podíamos contar com uma razão isenta. Da mesma forma, a grande descoberta de outro pensador – Freud – ao estabelecer a existência do inconsciente, mostrando o quanto de nossas escolhas e razões se distanciam de uma pretensa objetividade.

Então a busca para o sentido da verdade estaria condenada ao um debate estéril? Neste momento o debate nos coloca face à necessidade de entendimento histórico e filosófico do sentido da palavra verdade, porque a que nos referimos quando dizemos que isto é verdade ou isto não verdade? Mais uma vez buscaremos em Marilena Chauí uma contribuição para o sentido da palavra verdade.
Conforme esta filósofa a origem da palavra verdade possui três fontes distintas: do grego (aletheia), do latim (veritas) e do hebráico (emunah):

“Aletheia se refere ao que as coisas são; veritas se refere aos fatos que foram; emunah se refere às ações e as coisas que serão. A nossa concepção da verdade é uma síntese dessas três fontes e por isso se refere às coisas presentes (como na aletheia), aos fatos passados (como na veritas) e às coisas futuras (como na emunah). Também se refere à própria realidade (como na aletheia), à linguagem (como na veritas) e à confiança-esperança (como na emunah). Palavras como “averiguar” e “verificar” indicam buscar a verdade; “veredicto” é pronunciar um julgamento verdadeiro, dizer um juízo veraz; “verossímil” e “verossimilhante” significam: ser parecido com a verdade, ter traços semelhantes aos de algo verdadeiro.” (Marilena Chaui, Convite à Filosofia De Marilena Chaui Ed. Ática, São Paulo, 2000.)
Estas três noções comportariam praticamente a maioria das teorias a respeito da verdade, entendendo a verdade como validade racional (adequação do nosso intelecto ao objeto, ou do objeto ao nosso intelecto), validade lógica (fundada na coerência interna dos enunciados) e validade consensada (baseada em um consenso de uma comunidade de pensadores). Mas uma quarta noção que ganhou expressão particular a partir do Iluminismo é a da verdade como verificação empírica, fundada naquilo que nos informa os sentidos.
Qualquer que seja a definição de verdade existem pontos fundamentais na sua busca: o entendimento de nossos condicionamentos no observar a natureza, seja porque nos apoiamos apenas no senso originário de nossas experiências não sistemáticas do cotidiano, seja pelos nossos preconceitos (pré julgamento do real), sejam os erros dos nossos sentidos (olho para o sol e vejo um objeto do tamanho de um balão); ou ainda daquilo que por nosso posicionamento de classe filtramos como o real. A verdade nasce da emancipação plena e só nesta condição nossos juizos poderão possuir esta intimidade com aquilo que definimos como real ou como o ser.
Fontes bibliográficas:

1 - CHAUÍ, Marilene “Convite à Filosofia” – Edição na Internet – Pausa Para Filosofia – 14 de fevereiro de 2003.
2 - Tart, Charles – Estados de Conscência e Ciências dos Estados Específicos. – “Além do Ego” – Editoria Clutrix/Pensamento
3 - Wilber, K – Um Deus Social – Editora Cultrix – SP-1983
4 - PIAGET, Jean – “Sabedoria e Ilusões da Filosofia” – in Coleção Os Pensadores – Abril Cultural – 1978.

Frederico Ozanam Drummond - professor de filosofia

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