Este blog teve sua inspiração como uma ferramenta de apoio aos meus alunos da Escola Estadual Emílio de Vasconcelos Costa. Foram praticamente dois anos de estudos, debates, reflexões, mas principalmente de muita aprendizagem. Aprendizagem para mim professor. Foi um espaço de permanente experimentação. Sua história já não pertence individualmente a qualquer um de nós - alunos, professores, dirigentes. Virou um espaço coletivo. Esta é a razão porque agora seu conteúdo será mantido como seu propósito original: uma ferramente de trabalho.
Imagino que ele poderá produzir novas inspirações. Outras experiências poderão ser criadas, tendo como base o uso da informática como ferramenta para a democratização do saber. Desta forma esta é apenas em parte uma despedida minha aos meus alunos e colegas do Emílio. Assumirei novos desafios. Mas ser aluno é apenas um condição temporária de qualquer um de nós; o que é permanente é nossa busca por nível sempre mais elevado de consciência. Esta busca exige disciplina, dedicação, momentos de recolhimento, momentos de desprendimento.
Afinal - debatemos isto muitas vezes - o que nos perguntamos é: o que nos motiva? O que faz com que diariamente cada um se levante, após um sono bem ou mal dormido, realise nossa rotina matinal de higiene e saia em busca de algo. ALGO O QUE? O que queremos? Quais nossos propósitos? O que pretedemos da vida?
Lembram-se do poema do poeta Drummond de Andrade:
" Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
porque sabes que dormindo
os problemas te dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar
prova a existência da grande máquina
e te repõe pequenino
em face a indecifrável palmeiras."
Pois é isto - o sono como fuga. Como fuga de nossas dores emocionais, nossas dores físicas, nossas dores pelo que nós nem mesmo sabemos porque.
Em sala comentamos que alguns de nós (os mais fracos será? podemos afirmar isto?) buscam aliviar estas dores usando drogas. E ai descobrem muito rápido novas dores. Estamos irremediavelmente condenados a estes destinos?
Não - sabemos que não. E como o valeiro andante - ainda que seja à moda do Dom Quixote - subimos em nossa montaria e vamos em busca do Santo Grau, da Pedra Filosofal ou qualquer outro grande símbolo dos nossos mitos pessoais e coletivos que animam nossas escolhas na vida. Assim é. Assim será. Agora nossa viagem segue em busca do Grande Propósito, que cabe a cada um de nós descobrir. A todas um boa viagem. E até mais.
NÓS AMAMOS SOPHIA (*)
Café Filosófico e Espaço Vivencial: Registro das reflexões e vivências de todos aqueles que buscam seus propósitos, em cada momento da vida, e contam com a ajuda da filosofia, de terapias e jornadas existenciais para seu crescimento pessoal e coletivo. Buscamos a interação com nossa comunidade, na perspectiva da exercício da cidadania. (*) Do grego - Phylo = Amor; Sophia = Sabedora. Assim: Filosofia signfica "Amor a Sabedoria"
sexta-feira, 25 de janeiro de 2013
segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
IDEOLOGIA ALIENAÇÃO: O que aprendemos com a Filosofia da Ciência.
Conceitos
como IDEOLOGIA e ALIENAÇÃO tiveram grande importância no pensamento do filósofo
Karl Marx. Sabemos que a Ideologia é uma visão de mundo, ou seja, os valores,
interesses e crenças de uma determinada classe social. Quando Marx analisou o capitalismo ele
observou que a classe dominante tinha sua própria ideologia. Através da
propaganda, do ensino nas escolas, da indústria do cinema, dos programas de TV e
outros meios, esta classe dominante transmitia sua ideologia (seus valores)
para toda a sociedade, fazendo com que esta mesma sociedade assumisse a
ideologia da classe dominante como se fosse sua. Este fato acontece sem que nós
percebamos isto. Esta é uma das faces perversa do processo de alienação. As
pessoas esquecem o sentido da própria vida e o valor real do seu trabalho e
passam a adotar valores que não são seus. Consumimos novos produtos, não porque
precisamos, mas porque a propaganda nos faz acreditar que este é o nosso
desejo. E assim, novas pesquisas e novas tecnologias financiadas pelas classes
dominantes alimentam a descoberta de novos produtos. Os recursos do planeta vão
se esgotando apenas para alimentar o Capital. Qual a ética de tudo isto. Como a
Filosofia das Ciências pode contribuir com esta reflexão? Foi este o centro de
nossos debates no último bimestre do ano e sobre qual faremos nossas
avaliações.
Para refletir:
a) Se muitas das pesquisas científicas são financiadas pelos donos do Capital, será que estar pesquisas estão voltadas para ajudar a maioria das pessoas ou para aumentar mais o lucro do próprio Capital?
b) Será que as grandes empresas gastam dinheiro com pesquisas se elas não tiverem interesses financeiro nestas mesmas pesquisas? Neste caso estas pesquisas são isentas de intesses? Elas são neutras?
c) Você já ouviu falar de remédios que são lançados do mercado, depois são proibidos pelos órgãos de fiscalização porque estes remédios possuem efeitos danosos à saude?
d) Como um cientísta pode concordar com isto sem denunciar estes efeitos negativos que ele mesmo pesquisou?
Frederico Drummond: professor de filosofia
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
PARA REVER CONCEITOS DA TEORIA DO CONHECIMENTO – 22/11/2012
ROTEIRO
1 – Descreva o que é “Ato do Conhecer”
1 – Descreva o que é “Ato do Conhecer”
2 – O que significa Intuição?
3 – O que é o conhecimento discursivo?
4 – O que é dogmatismo em filosofia.
5 – O que é ceticismo?
6 – Porque Marx e Freud são conhecidos como “Mestres da
Suspeita”.
7 – A ideologia limita a busca do conhecimento? Por quê?
8 – E o inconsciente (Freud) também pode limitar a buscar do
conhecimento ou não? Por quê?
9 – O método de pesquisa adotado nas ciências da natureza é
adequado para pesquisar os fenômenos das ciências humanas? Explique.
10 – Porque a estatística é considerada uma boa ferramenta
no estudo dos fatos sociais?
11 – Alguém pode alcançar a verdade? Explique.
12 – Porque o racionalismo sofreu fortes críticas no final
do século XIX e início do século XX.
13 – O que significa Paradigma?
14 – A física quântica alterou paradigmas no campo da Teoria
do Conhecimento? Explique.
15 – As pesquisas voltadas para novas tecnologias são sempre
éticas? Explique.
sábado, 10 de novembro de 2012
Conceito geral de ideologia na música de Cazuza
Você
já prestou atenção na letrada canção Ideologia, de Cazuza e Roberto Frejat?
Diante de uma vida sem sentido, um jovem assiste a tudo "em cima do muro''
e sequer conhece bem a si mesmo. Lamenta ter perdido o sonho de mudar o mundo e
por isso, no refrão, brada por uma ideologia: "Eu quero uma pra
viver!".
O que transparece nesse apelo é o desejo de valorizar sua vida com
significados outros que não dependam de modismos e concepções alheias. Para
tanto, ele precisa pensar por si mesmo e adquirir autonomia de ação.
Esse exemplo
nos dá o sentido mais geral e positivo do conceito de ideologia, como conjunto de
ideias, crenças ou opiniões sobre algum ponto sujeito a discussão. Falamos
então da ideologia de um pensador, do corpo sistemático de suas ideias, do seu
posicionamento interpretativo diante de certos fatos. É assim que distinguimos
ideologia liberal, de ideologia socialista, as duas principais visões políticas,
sociais e econômicas do nosso tempo.
Um grito de Cazuza: "Ideologia - Eu quero uma pra vive"r
Meu partido
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas
Os meus sonhos
Foram todos vendidos
Tão barato
Que eu nem acredito
Ah! eu nem acredito...
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas
Os meus sonhos
Foram todos vendidos
Tão barato
Que eu nem acredito
Ah! eu nem acredito...
Que aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Frequenta agora
As festas do "Grand Monde"...
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Frequenta agora
As festas do "Grand Monde"...
Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver...
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver...
O meu prazer
Agora é risco de vida
Meu sex and drugs
Não tem nenhum rock 'n' roll
Eu vou pagar
A conta do analista
Pra nunca mais
Ter que saber
Quem eu sou
Ah! saber quem eu sou..
Agora é risco de vida
Meu sex and drugs
Não tem nenhum rock 'n' roll
Eu vou pagar
A conta do analista
Pra nunca mais
Ter que saber
Quem eu sou
Ah! saber quem eu sou..
Pois aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro...
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro...
Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Pra viver...
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Pra viver...
Pois aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro...
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro...
Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver..
Ideologia!
Pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver...
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver..
Ideologia!
Pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver...
Exercício para ampliar nossa capacidade de reflexão . 3
Leia
a citação de George Kneller (abaixo) e explique o que se ganha e o que se perde com a
abstração.
''A
ciência elimina a maior parte da aparência sensível e estética da natureza. “Poentes
e cascatas são descritos em termos de frequências de raios luminosos,
coeficientes de refração e forças gravitacionais ou hidrodinâmicas”.
(George
F. Kneller. A ciência como atividade humana. Rio de Janeiro: Zahar, 1980. p.
149.)
Exercício para ampliar nossa capacidade de reflexão . 2
Revendo
o capitulo
1
- Quais são as principais
características do conhecimento intuitivo?
2
- O que é conhecimento discursivo? Dê exemplos diferentes dos já citados.
Exercício para ampliar nossa capacidade de reflexão . 1
"O
filósofo é critico, embora não seja cético. Não desespera da verdade, mas
recusa todas as certezas, considerando-as provisórias e sujeitas a serem relativizadas
por novos argumentos." (Sérgio Paulo Rouanet. As razões do Iluminismo. São
Paulo: Companhia das Letras, 1987. p. 320.)
Explique
a citação respondendo às questões a seguir.
a)
O que é um filósofo cético? –
b)
O que é a filosofia dogmática? –
c)
É possível recusar tanto o ceticismo como o dogmatismo? Justifique sua
resposta.
A VERDADE COMO HORIZONTE
Vimos
que, no correr da história humana, existiram diversas maneiras de compreender o
que é a verdade. O critério da evidência prevaleceu na Antiguidade e na Idade
Média e sofreu alterações na modernidade, com Descartes, que não renunciou à
possibilidade do conhecimento. Posteriormente, as posições conflitantes entre
dogmáticos e céticos nos ensinam a desconfiar das certezas, postura que se
tornou mais aguda na contemporaneidade. Se não sucumbirmos ao ceticismo radical
– que em última instância recusa a filosofia - nem ao dogmatismo- que se aloja
na comodidade das verdades absolutas-, poderemos melhor suportar o espanto, a
admiração, a controvérsia e aceitar o movimento contínuo entre certeza e
incerteza. Isso não significa renunciar à procura do conhecimento, porque conhecer
é dar sentido ao mundo, interpretar a realidade é descobrir a melhor maneira
para agir. A verdade continua como um propósito humano necessário e vital, que
exige a liberdade de pensamento e o diálogo, para que os indivíduos
compartilhem as interpretações possíveis do real.
As verdades da razão
“Raciocinar
não é algo que aprendemos em solidão, mas algo que inventamos ao nos comunicar
e nos confrontar com os semelhantes: toda razão é fundamentalmente
conversação”. 'Conversar' não é o mesmo que ouvir sermões ou atender a vozes de
comando. Só se conversa - sobretudo só se discute - entre iguais. Por isso o hábito
filosófico de raciocinar nasce na Grécia, junto com as instituições políticas
da democracia. Ninguém pode discutir com Assurbanipal ou com Nero, e ninguém
pode conversar abertamente em uma sociedade em que existem castas sociais
inamovíveis.
[
... ]Afinal de contas, a disposição a filosofar consiste em decidir-se a tratar
os outros como se também fossem filósofos: oferecendo-lhes razões, ouvindo as
deles e construindo a verdade, sempre em dúvida, a partir do encontro entre
umas e outras.
[
... ]A democracia se baseia na suposição de que não há homens que nascem para
mandar nem outros que nascem para obedecer, mas todos nós nascemos com a
capacidade de pensar e, portanto, com o direito político de intervir na gestão
da comunidade de que fazemos parte. No entanto, para que os cidadãos possam ser
politicamente iguais, é imprescindível que, por outro lado, nem todas as suas
opiniões o sejam: deve haver algum meio de hierarquizar as ideias na sociedade
não hierárquica, potencializando as mais adequadas e descartando as errôneas ou
daninhas. Em resumo, buscando a verdade. Essa é justamente a missão da razão
cujo uso todos nós compartilhamos.
[
... ]. Na sociedade democrática, as opiniões de cada um não são fortalezas ou
castelos para que neles nos encerremos como forma de autoafirmação pessoal:
'ter' uma opinião não é 'ter' uma propriedade que ninguém tem o direito de nos
arrebatar. Oferecemos nossa opinião aos outros para que a debatam e por sua vez
a aceitem ou refutem, não simplesmente para que saibam 'onde estamos e quem
somos'. E é claro que nem todas as opiniões são igualmente válidas: valem mais
as que têm melhores argumentos a seu favor e as que melhor resistem à prova de
fogo do debate com as objeções que lhe sejam colocadas.
[...
]A razão não está situada como um árbitro semidivino acima de nós para resolver
nossas disputas; ela funciona dentro de nós e entre nós. Não só temos que ser
capazes de exercer a razão em nossas argumentações como também- e isso é muito
importante e, talvez, mais difícil ainda- devemos desenvolver a capacidade de
ser convencidos pelas melhores razões, venham de quem vierem.
[ ... ]A partir da perspectiva racionalista,a
verdade buscada é sempre resultado, não ponto de partida: e essa busca inclui a
conversação entre iguais, a polêmica, o debate, a controvérsia. Não como
afirmação da própria subjetividade, mas como caminho para alcançar uma verdade
objetiva através das múltiplas subjetividades.
SAVATER,
Fernando."As verdades da razão." Em: As perguntas da vida. - São
Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 43-44.
Questões
1
Que relação o autor estabelece entre conversação e democracia?
2
O que significa dizer que a razão funciona dentro de nós e entre nós?
3
Releia o tópico que fecha o capitulo "A verdade como horizonte" e
relacione a ideia de verdade com a frase do autor: "a verdade buscada é
sempre resultado, não ponto de partida".
Resenha do livro
Filosofando - de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins -
4ªEdição - Editora Moderna
OS MESTRES DA SUSPEITA - TEORIA DO CONHECIMENTO
O
racionalismo confiante de que há um mundo objetivo a ser desvendado pela razão
começou a sofrer abalos. Já sabemos que Hume e Kant colocaram em questão o
critério de verdade dos antigos, mas foi na segunda metade do século XIX e no começo
do XX que diversos filósofos intensificaram as críticas ao conceito de verdade
como representação e correspondência.
A
expressão "mestres da suspeita" foi cunhada pelo filósofo francês
Paul Ricoeur (1913-2005) para designar os pensadores Marx, Nietzsche e Freud. Segundo
Ricoeur, foram esses três pensadores que suspeitaram das ilusões da
consciência. Por consequência, para descobrir a verdade, é preciso proceder à
interpretação do que consideramos conhecer a fim de decifrar o sentido oculto
no sentido aparente.
a)
Marx: a ideologia
Karl
Marx (1818-1883) viveu intensamente o período de confronto do proletariado com
a elite econômica de seu tempo. Quando esteve na Inglaterra, conheceu de perto
a situação deplorável do operariado, obrigado a longas jornadas de trabalho em oficinas
insalubres e com baixa remuneração. Elaborou então sua teoria materialista,
segundo a qual as ideias devem ser compreendidas a partir do contexto histórico
da comunidade em que se vive, porque elas derivam das condições materiais, no caso,
das forças produtivas da sociedade. Percebeu também as contradições que surgem
entre essas forças produtivas e as relações de produção. Nesse contexto, as
ideias vigentes, que aparecem como universais e absolutas, são de fato parciais
e relativas, porque representam as ideias da classe dominante. As concepções
filosóficas, jurídicas, éticas, políticas, estéticas e religiosas da burguesia
são estendidas para o proletariado, perpetuando os valores a elas subjacentes
como verdades universais. Para Marx esse conhecimento que aparece de forma
distorcida é a ideologia, ou seja, um conhecimento ilusório que tem por
finalidade mascarar os conflitos sociais e garantir a dominação de uma classe,
impedindo que a classe submetida desenvolva uma visão do mundo mais universal e
lute pela autonomia de todos.
b)
Nietzsche: o critério da vida Friedrich Nietzsche (1844-1900) procedeu a um deslocamento
do problema do conhecimento, alterando o papel da filosofia. Para ele, o
conhecimento não passa de interpretação, de atribuição de sentidos, sem jamais
ser uma explicação da realidade. Conferir sentidos é, também, conferir valores,
ou seja, os sentidos são atribuídos a partir de determinada escala de valores
que se quer promover ou ocultar. Para Nietzsche, o conhecimento resulta de uma luta,
do compromisso entre instintos. Ao compreender a avaliação que foi feita desses
instintos, descobre que o único critério que se impõe é a vida. O critério da
verdade, portanto, deixa de ser um valor racional para adquirir um valor de
existência. O que Nietzsche quer dizer com "critério da vida”? Ao
perguntar- se que sentidos atribuídos às coisas fortalecem nosso "querer
viver" e quais o degeneram, questiona os valores para distinguir quais nos
fortalecem vitalmente e quais nos enfraquecem.
Outra
teoria que destaca o caráter interpretativo de todo conhecimento é a do
perspectivismo, que consiste em considerar uma ideia a partir de diferentes
perspectivas. Essa pluralidade de ângulos não nos leva a conhecer o que as
coisas são em si mesmas, mas é enriquecedora por nos aproximar mais da
complexidade da vida em seu movimento.
c)
Freud e o inconsciente - Sigmund Freud (1856-1939), fundador da psicanálise, desmente
as crenças racionalistas de que a consciência humana é o centro das decisões e
do controle dos desejos, ao levantar a hipótese do inconsciente. Diante de
forças conflitantes, o indivíduo reage, mas desconhece os determinantes de sua
ação. Caberá ao processo psicanalítico auxiliá-lo na busca do que foi silenciado
pela repressão dos desejos. A hipótese do inconsciente tornou-se fecunda ao permitir
a compreensão de uma série de acontecimentos da vida psíquica. Para a
psicanálise, todos os nossos atos trazem significados ocultos que podem ser
interpretados. Usando de uma metáfora, poderíamos dizer que a vida consciente é
apenas a ponta de um iceberg, cuja montanha submersa simboliza o inconsciente.
Os
sintomas que vêm do inconsciente devem ser decifrados na sua linguagem
simbólica, já que o simbolismo é o modo de representação indireta e figurada de
uma ideia, conflito ou desejo inconsciente. Há vários tipos de sondagem do
inconsciente, mas, para Freud, os sonhos constituem o caminho privilegiado, que
ele procura desvendar pelo método da associação livre.
As
críticas elaboradas por Marx, Nietszche e Freud repercutiram de maneira
significativa nas reflexões posteriores sobre o sentido da verdade e o alcance
do nosso conhecimento. Filósofos de correntes diferentes, como o pragmatismo, a
filosofia da linguagem, o neopositivismo, o neomarxismo, enfim, das mais
diversas tendências, se ocuparam com essa questão.
Resenha do livro Filosofando - de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins - 4ªEdição - Editora Moderna.
Resenha do livro Filosofando - de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins - 4ªEdição - Editora Moderna.
Podemos alcançar a certeza?
A certeza é o resultado de nossa adesão ao que consideramos verdadeiro.
•
O dogmatismo - Há vários
significados para o conceito de dogmatismo
a)
O dogmatismo do senso comum - No senso comum, o dogmatismo designa as certezas não
questionadas do nosso cotidiano: de posse do que supõe verdadeiro, a pessoa
fixa-se na certeza e abdica da dúvida..
b)
O dogmatismo filosófico - A filosofia dogmática serve para identificar os
filósofos que estão convencidos de que a razão pode alcançar a certeza
absoluta. O filósofo David Hume colocou em questão nossa capacidade de atingir
certezas absolutas. Sua influência foi decisiva para Kant, que, na obra Crítica
da Razão Pura, põe a razão em um tribunal a fim de definir os limites e as
possibilidades do conhecimento.
• O
ceticismo - O cético tanto observa e
pondera que conclui, nos casos mais radicais de ceticismo, que o conhecimento é
impossível. Nas tendências moderadas, o cético suspende provisoriamente
qualquer juízo ou admite apenas uma forma restrita de conhecimento, reconhecendo
os limites para a apreensão da verdade. Para alguns, mesmo que seja impossível
encontrar a certeza, não se deve abandonar a busca da verdade. O grande
representante do ceticismo foi outro grego, Pirro de Élida (séc. IV-III a.C. ).
Para Pirro, a atitude coerente do sábio é a suspensão do juízo e, como
consequência prática, a aceitação com serenidade do fato de não poder discernir
o verdadeiro do falso. Além do aspecto epistemológico, essa postura tem um
caráter ético, porque aqueles que se prendem a verdades indiscutíveis estão
fadados à infelicidade, já que tudo é incerto e fugaz. No Renascimento, o
filósofo francês Michel de Montaigne retoma o ceticismo ao contrapor-se às certezas
da escolástica e à intolerância, atitude que marcara o período de lutas
religiosas. David Hume (séc. XVIII) admite o ceticismo ao reconhecer os limites
muito estreitos do entendimento humano. Mais que isso, pondera que estamos subjugados
pelos sentidos e pelos hábitos, o que reduz as nossas certezas a simples
probabilidades. Recusa a metafísica e portanto os princípios a priori que
tentem justificar nosso conhecimento. Hume, porém, não se diz adepto de um
ceticismo extremado, como o do grego Pirro. Ao contrário, considera mais
vantajoso à humanidade o ceticismo atenuado, que limita "as nossas
pesquisas aos assuntos que mais se adaptarem à estreita capacidade do
entendimento humano". Nesse sentido, Hume refere-se às crenças teóricas e
práticas, que podem ser corretas ou incorretas e nos orientam no cotidiano.
Assim, quando uma bola de bilhar bate em outra e a movimenta, tendemos a
aceitar o principio da causalidade: uma bola é a causa do movimento da outra
(que é seu efeito). Trata-se, porém, de uma crença, que resulta da conjunção habitual
entre um objeto e outro:
Teorias sobre a verdade
Que
critério nos permite reconhecer a verdade e distingui-la do erro? Ou seja, que
condições a verdade exige para ser aceita como tal? Quando afirmar que algo é
verdadeiro? A resposta mais frequente está na evidência como critério da
verdade. Veremos os filósofos que são adeptos dessa teoria e aqueles que
contemporaneamente a criticam.
•
O critério da evidência
Segundo
a teoria da correspondência, representada na filosofia desde Aristóteles, é
verdadeira a proposição que corresponde a um fato da realidade. Embora a teoria
da correspondência tenha adeptos ainda hoje, recebeu muitas críticas por conta da
dificuldade de explicar o que significa uma proposição corresponder a um fato.
Em outras palavras, a verdade é a representação do mundo como ele realmente é
ou como nos aparece? Afinal, se temos acesso aos fatos apenas pelas nossas
crenças, e essas não são verificadas por outros meios, a não ser por elas
mesmas, como garantir que nosso pensamento corresponde aos fatos?
Resenha do livro Filosofando - de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins - 4ªEdição - Editora Moderna.
Resenha do livro Filosofando - de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins - 4ªEdição - Editora Moderna.
O QUE PODEMOS CONHECER?
1
- O ato de conhecer - O campo de investigação filosófica que abarca as
questões sobre o conhecer chama-se Teoria do Conhecimento. Tradicionalmente
costuma-se definir conhecimento como o modo pelo qual o sujeito se apropria
intelectualmente do objeto. Entendemos por conhecimento o ato ou o produto do
conhecimento.
•
O ato do conhecimento diz respeito à relação que se estabelece entre o sujeito
cognoscente e o objeto a ser conhecido. O objeto é algo fora da mente, mas
também a própria mente, quando percebemos nossos afetos, desejos e ideias.
•
O produto do conhecimento é o que resulta do ato de conhecer, ou seja, o
conjunto de saberes acumulados e
recebidos pela cultura, bem como os saberes que cada um de nós acrescenta à
tradição: as crenças, os valores, as ciências, as religiões, as técnicas, as
artes, a filosofia etc. este capítulo, vamos privilegiar o primeiro aspecto: o
ato de conhecer.
2
- Os modos de conhecer
De
que maneiras o sujeito cognoscente apreende o real? Geralmente consideramos o
conhecimento como um ato da razão, pelo qual encadeamos ideias e juízos, para
chegar a uma conclusão. Essas etapas compõem o nosso raciocínio. No entanto,
conhecemos o real também pela intuição. Vejamos a diferença entre intuição e conhecimento discursivo.
•
A intuição – Trata-se de um conhecimento
imediato – alcançado sem intermediários -, um tipo de pensamento direto, uma
visão súbita. (o famoso: EUREKA!)
•
Conhecimento discursivo - Para
compreender o mundo, a razão supera as informações concretas e imediatas
recebidas por intuição e organiza-as em conceitos ou ideias gerais que,
devidamente articulados pelo encadeamento de juízos e raciocínios, levam à
demonstração e a conclusões. Portanto, o conhecimento discursivo, ao contrário
da intuição, precisa da palavra, da linguagem. Por ser mediado pelo conceito, o
conhecimento discursivo é abstrato.
Como
se dá então o conhecimento? Ao afastar-se do vivido, a razão enriquece o
conhecimento pela interpretação e pela crítica. Esse distanciamento, porém,
como enfatizam alguns filósofos, pode representar um empobrecimento da
experiência intuitiva que temos do mundo e de nós mesmos. Por isso, o
conhecimento se faz pela relação contínua entre intuição e razão, vivência e
teoria, concreto e abstrato.
3
- A verdade
O
que é a verdade? O que alguém quer dizer quando afirma que uma proposição é
verdadeira? Primeiro, vamos comparar o conceito de verdade com o de veracidade
e o de realidade.
• Verdade e
veracidade: suponhamos que
alguém me diz que há um lado da Lua que nunca é visto da Terra. Se eu lhe perguntar:
"Isto é verdade?", a indagação pode ter dois sentidos. O primeiro é
se meu interlocutor está me dizendo uma verdade ou se está mentindo.Nesse
caso, trata-se da veracidade, que nos coloca diante de uma questão moral: o
indivíduo veraz é o que não mente. O segundo sentido é propriamente
epistemológico: quero saber se a afirmação de meu interlocutor é
verdadeira ou falsa. Para tanto, indago se a proposição corresponde à
realidade, se já foi comprovada, se a fonte de informação é digna de crédito ou
não.
• Verdade
e realidade: embora diferentes esses dois conceitos são frequentemente
confundidos na linguagem cotidiana. A verdade do conhecimento diz respeito a
uma proposição que expressa um fato do mundo. Assim, quando afirmamos
"Este colar é de ouro'', a proposição é falsa caso se trate de uma
bijuteria. Mas se nos referimos a coisas (um colar, um quadro, um dente) só
podemos afirmar que são reais, e não verdadeiras ou falsas. Portanto, o falso
ou o verdadeiro não estão na coisa mesma, mas no juízo, que representa uma
situação possível. Ao beber o líquido escuro que me parecia café, emito os
juízos: "Este líquido não é café" e "Este líquido é
cevada". Portanto, a verdade (ou falsidade) se dá quando afirmamos ou
negamos algo sobre uma coisa, e esses juízos correspondem (ou não) à realidade.
Estamos diante de um primeiro sentido de verdade: um juízo verdadeiro é aquele
que corresponde aos fatos. Ainda que essa definição pareça óbvia e esteja de
acordo com o senso comum, há outra questão que diz respeito ao critério de
verdade: podemos saber como as coisas são de fato?
Resenha do livro Filosofando - de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins - 4ªEdição - Editora Moderna.
A contribuição da filosofia em significar nossa história de vida.
Por alfeu
“Quem sou eu? Qual o sentido da existência? Que papel eu desempenho nela?” Premidas pelas urgências da vida prática, ou fascinadas pelas distrações que o mundo oferece, as pessoas costumam colocar essas perguntas de lado em seu atarefado dia a dia. Simplesmente as descartam ou adiam, à espera de um “depois” que, muitas vezes, nunca chega.
Foram, no entanto, perguntas desse tipo que impulsionaram a filosofia desde antes dos gregos. E, diante de uma grande crise ou de uma imprevista guinada na trajetória existencial, são elas que irrompem na tela da consciência, cobrando a atenção que merecem.
Tais perguntas são também o ponto de partida do livro História pessoal e sentido da vida, de Dulce Critelli, professora titular do Departamento de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Publicado com apoio da FAPESP , o livro, de poucas páginas e leitura fluente, mas conteúdo denso e longamente elaborado, apresenta o fundamento filosófico do método terapêutico-educativo desenvolvido pela autora, com o nome de “historiobiografia”.
Critelli emprega esse método tanto em sessões individuais de aconselhamento como em reuniões de grupo nas quais os participantes são direcionados e instrumentalizados para refletir sobre suas autobiografias e compreendê-las.
“Descobri que muitos de nossos problemas decorrem menos de fatores psicológicos do que filosóficos. Não são os traumas, mas uma incompreensão do sentido da vida que os originam”, afirmou.
“Nessa perspectiva, a filosofia pode ser uma ferramenta fundamental. Quando pensamos, transformamos nossas crenças e, consequentemente, nosso modo de viver. A filosofia não é clínica, mas possui uma inequívoca força terapêutica, que reside naquilo que propriamente a caracteriza: sua estrutura reflexiva. Toda reflexão é um exercício de entendimento que retira os eventos de seu ocultamento (que vai do mero desconhecimento às interpretações corriqueiras) e os lança à luz”, disse.
Essa estrutura reflexiva é o traço comum de toda atividade filosófica. Mas a autora se pauta por uma escola filosófica específica, a da chamada “filosofia da existência”, desenvolvida por Martin Heidegger (1889-1976) e Hannah Arendt (1906-1975). O livro de Critelli é fortemente calcado no pensamento de Heidegger e, mais ainda, no de Arendt, profusamente citado ao longo do texto.
Segundo Arendt, os eventos da vida precisam ser arranjados em uma história para podermos lidar com eles. Como a pensadora muitas vezes afirmou, citando uma frase da escritora dinamarquesa Karen Blixen (que escreveu sob o pseudônimo de Isak Dinesen): “Todas as mágoas são suportáveis quando fazemos delas uma história ou contamos uma história a seu respeito”.
É essa ideia que fundamenta a “historiobiografia” e constitui o leitmotiv de História pessoal e sentido da vida. “Nossa existência pessoal não é um conjunto desconexo de eventos”, argumenta a autora.
“Seu sentido se articula nas histórias que, consciente ou inconscientemente, contamos para nós mesmos. E, quando percebemos o fio de nossa existência, tornamo-nos muito mais disponíveis para fazer transformações. Descobrindo o padrão, descobrimos também o potencial de ação”, falou.
Segundo Critelli, o padrão existencial se apoia em frases que as pessoas ouvem de outras ou que, acriticamente, dizem para si mesmas. Ela chama essas frases de “relatos”. São afirmações curtas e fragmentadas, muitas vezes aprendidas na infância, e repetidas ao longo da vida. Perpetuando-se pela repetição, perpetuam também, como se fosse fatalidade, um determinado modo de ser.
Frequentemente os indivíduos se sentem prisioneiros desses padrões que eles mesmos ajudaram a criar. Quando trazem tais “relatos” para a luz da consciência e os submetem ao crivo da reflexão crítica, começam a se libertar de seu poder paralisante. E colocam ou recolocam suas vidas em movimento.
“Temos a ilusão de que moramos em um mundo significativo em si e por si mesmo. Mas, em si mesmo, o mundo é pura coisa. É nossa linguagem que o transforma em um mundo. Habitar o mundo é habitar a linguagem”, sublinhou Critelli.
Trata-se, então, de substituir os relatos acríticos e fragmentários que povoam a linguagem vulgar por uma historia pessoal construída a partir da reflexão. A expectativa é que, ao se apoderar dessa história, o indivíduo simultaneamente se empodere. E deixe de ser vítima de uma imaginária fatalidade para se tornar senhor de si mesmo.
História pessoal e sentido da vida
A construção da história pessoal
Por José Tadeu Arantes, da Agência FAPESP“Quem sou eu? Qual o sentido da existência? Que papel eu desempenho nela?” Premidas pelas urgências da vida prática, ou fascinadas pelas distrações que o mundo oferece, as pessoas costumam colocar essas perguntas de lado em seu atarefado dia a dia. Simplesmente as descartam ou adiam, à espera de um “depois” que, muitas vezes, nunca chega.
Foram, no entanto, perguntas desse tipo que impulsionaram a filosofia desde antes dos gregos. E, diante de uma grande crise ou de uma imprevista guinada na trajetória existencial, são elas que irrompem na tela da consciência, cobrando a atenção que merecem.
Tais perguntas são também o ponto de partida do livro História pessoal e sentido da vida, de Dulce Critelli, professora titular do Departamento de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Publicado com apoio da FAPESP , o livro, de poucas páginas e leitura fluente, mas conteúdo denso e longamente elaborado, apresenta o fundamento filosófico do método terapêutico-educativo desenvolvido pela autora, com o nome de “historiobiografia”.
Critelli emprega esse método tanto em sessões individuais de aconselhamento como em reuniões de grupo nas quais os participantes são direcionados e instrumentalizados para refletir sobre suas autobiografias e compreendê-las.
“Descobri que muitos de nossos problemas decorrem menos de fatores psicológicos do que filosóficos. Não são os traumas, mas uma incompreensão do sentido da vida que os originam”, afirmou.
“Nessa perspectiva, a filosofia pode ser uma ferramenta fundamental. Quando pensamos, transformamos nossas crenças e, consequentemente, nosso modo de viver. A filosofia não é clínica, mas possui uma inequívoca força terapêutica, que reside naquilo que propriamente a caracteriza: sua estrutura reflexiva. Toda reflexão é um exercício de entendimento que retira os eventos de seu ocultamento (que vai do mero desconhecimento às interpretações corriqueiras) e os lança à luz”, disse.
Essa estrutura reflexiva é o traço comum de toda atividade filosófica. Mas a autora se pauta por uma escola filosófica específica, a da chamada “filosofia da existência”, desenvolvida por Martin Heidegger (1889-1976) e Hannah Arendt (1906-1975). O livro de Critelli é fortemente calcado no pensamento de Heidegger e, mais ainda, no de Arendt, profusamente citado ao longo do texto.
Segundo Arendt, os eventos da vida precisam ser arranjados em uma história para podermos lidar com eles. Como a pensadora muitas vezes afirmou, citando uma frase da escritora dinamarquesa Karen Blixen (que escreveu sob o pseudônimo de Isak Dinesen): “Todas as mágoas são suportáveis quando fazemos delas uma história ou contamos uma história a seu respeito”.
É essa ideia que fundamenta a “historiobiografia” e constitui o leitmotiv de História pessoal e sentido da vida. “Nossa existência pessoal não é um conjunto desconexo de eventos”, argumenta a autora.
“Seu sentido se articula nas histórias que, consciente ou inconscientemente, contamos para nós mesmos. E, quando percebemos o fio de nossa existência, tornamo-nos muito mais disponíveis para fazer transformações. Descobrindo o padrão, descobrimos também o potencial de ação”, falou.
Segundo Critelli, o padrão existencial se apoia em frases que as pessoas ouvem de outras ou que, acriticamente, dizem para si mesmas. Ela chama essas frases de “relatos”. São afirmações curtas e fragmentadas, muitas vezes aprendidas na infância, e repetidas ao longo da vida. Perpetuando-se pela repetição, perpetuam também, como se fosse fatalidade, um determinado modo de ser.
Frequentemente os indivíduos se sentem prisioneiros desses padrões que eles mesmos ajudaram a criar. Quando trazem tais “relatos” para a luz da consciência e os submetem ao crivo da reflexão crítica, começam a se libertar de seu poder paralisante. E colocam ou recolocam suas vidas em movimento.
“Temos a ilusão de que moramos em um mundo significativo em si e por si mesmo. Mas, em si mesmo, o mundo é pura coisa. É nossa linguagem que o transforma em um mundo. Habitar o mundo é habitar a linguagem”, sublinhou Critelli.
Trata-se, então, de substituir os relatos acríticos e fragmentários que povoam a linguagem vulgar por uma historia pessoal construída a partir da reflexão. A expectativa é que, ao se apoderar dessa história, o indivíduo simultaneamente se empodere. E deixe de ser vítima de uma imaginária fatalidade para se tornar senhor de si mesmo.
História pessoal e sentido da vida
- Editora: Educ – Editora da PUC-SP
Páginas: 104
Preço: R$ 25
Mais informações: www.pucsp.br/educ
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
Ideologia e consciência social: filtros do conhecimento
O poema abaixo é de um grande mestre: Vinicius de Moraes. Como já falamos em outra oportunidade, citando a filósofa e professora Marilena Chaui, os poetas trazem, pela linguagem intuitiva e simbólica, conhecimentos filosóficos, como este mostrado no poema O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO. A ideologia e consciência social, já dizia Karl Marx, constituem um importante filtro para o processo de elaboração do conhecimento. Marx foi, juntamente com outros filósofos, considerado um dos "mestres da suspeita". Ele "supeitava" da existência de uma razão neutra, que nos pudesse fornecer um conhecimento puro, de uma ciência neutra de inderesses ideológicos. Vinicius de Moares retrata de forma magistral estes conceitos no poema que segue:
O operário em construção
Vinicius de Moraes
Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
- Garrafa, prato, facão -
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.
Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
- Exercer a profissão -
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.
E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação
- "Convençam-no" do contrário -
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.
Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!
Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.
Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
- Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.
Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!
- Loucura! - gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
- Mentira! - disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.
E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
- Garrafa, prato, facão -
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.
Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
- Exercer a profissão -
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.
E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação
- "Convençam-no" do contrário -
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.
Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!
Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.
Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
- Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.
Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!
- Loucura! - gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
- Mentira! - disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.
E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.
sexta-feira, 28 de setembro de 2012
Filosofia da Ciência e Teoria do Conhecimento: nossas disciplinas para o último bimestre do ano.
No dia 1º de Outubro de 2012 iniciamos o quarto e último bimestre escolar de 2012. E iniciamos programando atividades especiais. Nosso foco neste bimestre está no âmbito da Filosifa da Ciência e da Teoria do Conhecimento. Temas, sem dúvida, fascinantes. Iremos usar agora um metodologia mais ativa, com a participação mais direta dos alunos em todas as aulas. Para isto estamos programando para cada turma algo em torno de seis a sete seminários no bimestre. Os primeiros ocorrerão com as turmas do 3º e Segundo Ano Seriado, no dia 5 de outubro. Para introduzir o panorama destes seminários reproduzimos abaixo um texto que indaga os limites do conhecimento:
Frederico Ozanam Drummond - professor de filosofia
AS MÚLTIPLAS FACES DA VERDADE
De minha adolescência uma imagem marcante, que ficou como resíduo de memória, foram trechos de um filme que apresentava o julgamento de Jesus por Pôncio Pilatos, segundo a tradição dos evangelistas, no Novo Testamento da Biblia cristã:
A cena apresentava a figura do Nazareno, com as mãos, atadas e em certo momento Pilatos indaga: - O que é a verdade? A sequência do texto é expressa pelo evangelista João conforme reproduzimos abaixo:
“Perguntou-lhe, pois, Pilatos: Logo tu és rei? Respondeu Jesus: Tu dizes que eu sou rei. Eu para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz. João 18:37”
“Perguntou-lhe Pilatos: Que é a verdade? E dito isto, de novo saiu a ter com os judeus, e disse-lhes: Não acho nele crime algum João 18:38”
O silêncio de Jesus face à pergunta me pertubava. Como podia o filho de Deus calar-se pertante uma das indagações mais contundentes para todos os humanos? O incômodo deste silêncio tinha uma marca profundamente existencial e produzia uma ressonância em uma estrofe do poema “Alguma Poesia”, de Carlos Drummond de Andrade:
“(...) Meu Deus, porque me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.(...)”
Com o peso desta dúvida, tomada como pessoal, inicio minha trajetória em busca de alguma resposta. Afinal o que é a verdade? Porque em nome de uma verdade formamos exércitos, matamos e morremos? A minha verdade é uma mentira para meu inimigo, que defende a sua verdade, mentira para mim, em nome de Deus.
Em busca de uma sistematização
No início da década de 1970 muitos dos que adotaram uma ação de resistência ao regime militar tinha seus referenciais para a ação em uma leitura teológica da luta de emancipação do proletariado. Era natural, portanto, que os chamados movimentos de Ação Católica fossem buscar na noção de dialética, verdade histórica e ideologia, inspiradas no pensamento marxista, uma síntese com o pensamento cristão. Um importante teólogo que inspirou esta busca foi Theilhard Chadin. Havia uma necessidade premente de construirmos um sentido de verdade fundado nas pesquisas científicas, mas comprometido com a mensagem cristã. Nesta busca vale recordar alguns limites que poderiam ser apontados na nossa busca da verdade, senão vejamos.
Tendo como referência os textos da professora Marilene Chauí – Convite à Filosofia – observamos que toda a história da filosofia é marcada por dois pontos centrais:
a) (...) “ A verdade do mundo e dos humanos (...) podia ser conhecida por todos, através da Razão, que é a mesma em todos.(...) Assim a Filosofia nasce como conhecimento racional da ordem do mundo ou da Natureza (donde o nome cosmologia )(...)”
b) Se a realidade é um fato objetivo – exterior aos seres humanos – o maior desafio do saber filosófico é desenvolver uma metodologia, que através da razão, do pensamento, revele objetivamente esta verdade.
Numa fase posterior encontramos uma singular elaboração, desenvolvida pelo filósofo Sócrates, que identificará na introspecção o caminho do conhecimento. A expressão “conhece-te a ti mesmo”, tornou-se a divisa deste filósofo. “Por fazer do autoconhecimento ou do conhecimento que os homens têm de si mesmos a condição de todos os outros conhecimentos verdadeiros, é que o período socrático é antropológico”
De fato, este é um dos poucos momentos da filosofia que o, a saber, o conhecimento, é construído permeado pela psyché (e que arriscaríamos a considerar como os primórdios da investigação psicológica).
Todavia não encontramos aí nenhuma referência à noção de subjetividade. E, os períodos seguintes da história da filosofia, o conhecimento racional, de uma realidade que pode se revelar em sua objetividade constituirá o traço principal de todos os métodos. Em alguns momentos esta realidade se mostra como revelação (Deus mostra aos homens verdades que são dogmas, segundo seus porta-vozes terrenos).
Apenas no período contemporâneo (final do século XIX e toda a primeira metade do século XX) importantes descobertas, obrigam-nos a uma nova reflexão e, certamente, a uma postura intelectual mais tolerante.
O saber científico ao se identificar como A Ciência constrói verdadeiras muralhas em relação aos outros saberes – afinal ele é fruto de um método racional, de uma história que afirma este método e da própria objetividade que o credencia como saber legítimo. Mas neste caso faria sentido indagarmos sobre um possível diálogo entre Filosofia e Psicologia? De qual filosofia? De qual psicologia?
Provavelmente, por isto mesmo, o cientificismo (e seus ramos dentro da psicologia, como a utilização instrumentalizada do próprio Behaviorismo) ganha feições de dogma. O domínio e as descobertas científicas afastaram a filosofia de sua principal tarefa, que é o contínuo se indagar e se questionar.
Através das contribuições do crítico social e filósofo Carl Marx, depurou-se a noção de ideologia, como um grande filtro, a permear nossos olhares, reflexões e construção do saber. Se a ideologia permeia nosso próprio modo de fazer ciência não podíamos contar com uma razão isenta. Da mesma forma, a grande descoberta de outro pensador – Freud – ao estabelecer a existência do inconsciente, mostrando o quanto de nossas escolhas e razões se distanciam de uma pretensa objetividade.
Então a busca para o sentido da verdade estaria condenada ao um debate estéril? Neste momento o debate nos coloca face à necessidade de entendimento histórico e filosófico do sentido da palavra verdade, porque a que nos referimos quando dizemos que isto é verdade ou isto não verdade? Mais uma vez buscaremos em Marilena Chauí uma contribuição para o sentido da palavra verdade.
Conforme esta filósofa a origem da palavra verdade possui três fontes distintas: do grego (aletheia), do latim (veritas) e do hebráico (emunah):
“Aletheia se refere ao que as coisas são; veritas se refere aos fatos que foram; emunah se refere às ações e as coisas que serão. A nossa concepção da verdade é uma síntese dessas três fontes e por isso se refere às coisas presentes (como na aletheia), aos fatos passados (como na veritas) e às coisas futuras (como na emunah). Também se refere à própria realidade (como na aletheia), à linguagem (como na veritas) e à confiança-esperança (como na emunah). Palavras como “averiguar” e “verificar” indicam buscar a verdade; “veredicto” é pronunciar um julgamento verdadeiro, dizer um juízo veraz; “verossímil” e “verossimilhante” significam: ser parecido com a verdade, ter traços semelhantes aos de algo verdadeiro.” (Marilena Chaui, Convite à Filosofia De Marilena Chaui Ed. Ática, São Paulo, 2000.)
Estas três noções comportariam praticamente a maioria das teorias a respeito da verdade, entendendo a verdade como validade racional (adequação do nosso intelecto ao objeto, ou do objeto ao nosso intelecto), validade lógica (fundada na coerência interna dos enunciados) e validade consensada (baseada em um consenso de uma comunidade de pensadores). Mas uma quarta noção que ganhou expressão particular a partir do Iluminismo é a da verdade como verificação empírica, fundada naquilo que nos informa os sentidos.
Qualquer que seja a definição de verdade existem pontos fundamentais na sua busca: o entendimento de nossos condicionamentos no observar a natureza, seja porque nos apoiamos apenas no senso originário de nossas experiências não sistemáticas do cotidiano, seja pelos nossos preconceitos (pré julgamento do real), sejam os erros dos nossos sentidos (olho para o sol e vejo um objeto do tamanho de um balão); ou ainda daquilo que por nosso posicionamento de classe filtramos como o real. A verdade nasce da emancipação plena e só nesta condição nossos juizos poderão possuir esta intimidade com aquilo que definimos como real ou como o ser.
Fontes bibliográficas:
1 - CHAUÍ, Marilene “Convite à Filosofia” – Edição na Internet – Pausa Para Filosofia – 14 de fevereiro de 2003.
2 - Tart, Charles – Estados de Conscência e Ciências dos Estados Específicos. – “Além do Ego” – Editoria Clutrix/Pensamento
3 - Wilber, K – Um Deus Social – Editora Cultrix – SP-1983
4 - PIAGET, Jean – “Sabedoria e Ilusões da Filosofia” – in Coleção Os Pensadores – Abril Cultural – 1978.
Frederico Ozanam Drummond - professor de filosofia
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